Blog do Paulo Ruch

Cinema, Moda, Teatro, TV e… algo mais.

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Foto: Fernando Paixão

Se um dia o consagrado romancista e poeta irlandês James Joyce escreveu “Retrato de Um Artista Quando Jovem”, a dramaturga Carla Vilardi, antes promessa agora estabelecida como uma das representantes de nova geração que expõe seus pensamentos, criatividade e emoções numa narrativa teatral, escreveu “Brainstorming Anônimos”, que retrata artistas quando jovens. Um retrato de artistas quando jovens enfrentando altivamente seus dilemas e problemas de um difícil “poema”, cujos “versos” ditam sobre o “ser ator”. Sim, o “Ser Ator” de Laurence Olivier. No entanto, Carla em sua peça discorre não somente acerca das vicissitudes e solitudes em sua plenitude de um “operário das Artes”. Fala-se, com certeza, sobre este, contudo fala-se também de modo magistral do enorme e complexo panorama juvenil com toda a sua “tempestade” de sonhos, sentimentos emotivos, fraquezas, miudezas importantes, grandezas irrelevantes, dores cortantes, prazeres desconcertantes, amores possíveis e impossíveis, e o beijo que não foi dado. De forma arguta e inteligente, 7 atores que se desdobram em 49 personagens no alto florescer de suas juventudes “servem” como símbolos indispensáveis que trilham caminho inóspito e pedregoso, onde há cacto espinhoso e lírio formoso, em busca da palavra que resume toda uma existência: o sonho. Carla Vilardi, Luca Pougy, Ricardo Vianna, Pedro Aquino, Lu Rocha, Mari Pizzo e Victor Paes Leme, signos da força moça do palco, exploradores e desbravadores dos seus interiores, dos seus íntimos ínfimos e infinitos, desejosos de colocar pés bem esculpidos pelo Criador no tablado sagrado, venerado a que chamamos teatro. Aquilo que atormenta e alimenta cabeças iniciantes no ciclo vital “sofrem” estudo rigoroso e completo, e acreditem, divertido e leve, no espetáculo assistido. Usando sagazmente a figura da metalinguagem, intérpretes que respondem ao chamado do outro por números (Ator 1, Ator 2…) rabiscam não um esboço, desenham com ponta de lápis na sua mais fina constituição acontecimentos inolvidáveis, memoráveis, esquecíveis e desprezíveis das fases infantil, adolescente e adulta. A amarga dor que se carrega causada pelo desprezo de um beijo numa “ingênua” brincadeira de “salada de fruta”. A traição semelhante à punhal nas costas vindo de “amiga” que rouba de outra o amado em dia mundano e leviano de Carnaval. A eterna incompatibilidade das preferências masculinas e femininas. O perfilar dos arquétipos dos homens que fogem de modo inapelável da condição de “príncipe encantado”. As mulheres não querem um fanfarrão, tampouco um narcisista. As mulheres até admiram um gay, mas este não lhes pode oferecer o prazer físico, “apenas” o amor de uma sincera amizade. O “nerd” mesmo que o percebam, não as complementa. Malditos “games”, maldito futebol que atrapalham as relações. Não há livro de autoajuda que dê solução. E onde está o “ser ator” nesta “caleidoscópica caldeira”? Dizem que “querer é poder”. Nem sempre podemos. No entanto, quem arrebatará o consistente desejo de sonhar? O desejo de se viver de Arte? Não há repreensão e opressão dos pais, não há preconceito com a profissão, não há prepotência e arbitrariedade de alguns poucos “profissionais” dirigentes que demovam dos sonhadores aquilo que tanto almejam. Se empurrarmos com mãos espalmadas as portas que insistem em se manter fechadas, elas se entreabrirão. Entrem pela fresta. É o que resta. E o que dizer da fama? Fama insana, bacana, que dá grana, desejável, benfeitora e malfeitora. Fama que nos traz amigos não amigos e inimigos declarados. Não briguem com os jornalistas, pois eles podem dar pistas das coisas que não devem ser vistas. Ame. Ame o outro. Ame o próximo. Ame o igual e o desigual. Luca, Carla, Victor, Mari, Pedro, Lu e Ricardo esplendorosamente aceitam a hábil, sabedora e longe de admoestações direção de Bia Oliveira (Linda Gomes é a assistente de direção). Bia reverencia o drama, a introspecção, o intimismo, não se esquecendo da “explosão”, da boa “tempestade”, da leveza, do lúdico e da comédia. É a Bia que cria. A atuação de Carla Vilardi é doce, bonita, inquisidora, pensadora, filósofa e meiga. Luca Pougy é forte, sensível, seus olhos brilham, os caracóis dos seus cabelos são Sol que dá luz à cena. Grande ou pequena. Quando Luca sorri, corações nossos sorriem. Quando fica sério, continuam a sorrir. Luca nasceu para sorrirmos. Victor Paes Leme, moço com brancura e esbelteza, versátil, não esconde (para que esconder?) a sua nata expressividade. Pedro Aquino é uma “máquina” de interpretação sem botão de “stop”. Não existe botão que desligue o seu extravasamento de humor e carga emotiva. Seu corpo fala em vários tons. Todo o elenco fala em vários canoros tons. Ricardo Vianna, beleza pictórica que exclama, que clama, que grita o seu valor inegável de ator. A verdade de seus olhos azuis não me deixam mentir. A atriz Lu Rocha possui olhar que com simples e tênue movimento nos diz tudo. Todo o roteiro num olhar. Menina mulher tenra, densa, brava e delicada como rosa regada. Mari é uma graça em estado de graça, silhueta lindamente delgada, exponencialmente idolatrada, branda, franca, que tem benquerença pelo público. Eles cantam. Eles cantam Gonzaguinha em jogral. Cantam as “estações de Cássia”. Movimentam-se “total”. Mérito de Igor Pontes (preparador de elenco e diretor de movimento). Igor executou com classe e requinte a sua função. Nossos ouvidos vulneráveis a qualquer ímpeto foram surpresos pela bela e inefável voz de Bárbara Dias que entoa admirável canção original. Os figurinos e cenários de criação coletiva são enxutos, práticos, pertinentes e elegantes. Os corpos de cada um são assaz valorizados por um “blackout” básico nas cores, ou seja, a predominância do preto nas calças “fuseau”, saruel, e de malha, além de t-shirts e regatas. Entretanto, irrompe o colorido em “trench coat” vermelho e acessórios. Deparamo-nos com a sisudez dos ternos e um sobretudo digno de Oscar. O cenário é negro, um negro vivo, com araras, tamboretes, cestos, cabide, e cadeiras tão vivos quanto. A iluminação é generosa, faz-nos contemplativos. Uma eloquente luz aberta que “escancara” a cena. Um foco educado que faz carinho no rosto do artista. Sombras oblíquas que embelezam, um arco-íris mesmo que não tenha chovido em manhã ensolarada. A trilha sonora é envolvente, remete-nos ao plangente. “Pais e Filhos” da Legião. “O Que é, o Que é?” de Gonzaguinha, Phil Collins… Uma música própria de “thriller” em momento magnífico de diminutas lanternas a iluminar faces quietas, plácidas e gritantes. Os adereços não têm preço. Almofadas, bichinho de pelúcia, bengala e copos que faíscam cores. A peça pode ter acabado. Acabado é passado. Agora é que começa. Começa à beça. Começa à beça para Bia. Para Carla, Luca, Mari, Ricardo, Lu, Pedro e Victor. Meninos e meninas a quem os holofotes jamais lhes negarão um beijo. Ouçam este humilde e sincero conselheiro: “Vivam e não tenham a vergonha de serem felizes e atores. Pública ou anonimamente, pública e anonimamente. Não abram o guarda-chuva quando surgir a “tempestade”, não se protejam da chuva que abate. Deixem que suas mentes sejam molhadas e encharcadas pela Arte. Tornem público o seu ‘Brainstorming’!”.

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