Blog do Paulo Ruch

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Foto: Divulgação/TV Globo

“Em Família”, a nova novela da Rede Globo que estreou há duas semanas, escrita para o horário das 21h da Rede Globo por Manoel Carlos (e a colaboração de Angela Chaves, Juliana Peres, Maria Carolina, Mariana Torres e Marcelo Saback), com a direção geral de Jayme Monjardim e Leonardo Nogueira (além de Teresa Lampreia, Adriano Melo, Luciano Sabino e João Boltshauser), já teve duas fases, e estamos por ora acompanhando a terceira. Há que se entender que fases são distintas, e que obedecem à função precípua de desenhar um espaço de tempo, acontecimentos determinantes e a evolução da identidade dos personagens de uma trama. Devemos compreender também que cada teledramaturgo carrega a sua marca, o seu estilo, o seu “selo”, o seu tempo. Manoel Carlos já nos é bastante conhecido por sua notória apreciação de passagens nas quais possamos entender com calma, eu disse com calma, a personalidade dos membros de sua história, com a sucessão de diálogos elaborados. A primeira fase serviu de amostra eficiente do perfil dos personagens principais quando mais jovens ou crianças. Maneco, como é chamado pelos que lhe são próximos, quis retratar a vida bucólica e provinciana que aqueles levavam seja em Goiânia seja na fictícia Esperança. Houve a tentativa frutífera de clarificar como nasceu o amor entre os protagonistas Laerte e Helena, Eike Duarte e Julia Dalavia, respectivamente. A “raiz” de seus sentimentos. Como pudemos ser apresentados a Shirley (Giovanna Rispoli), filha de Mafalda (Simone Soares, esposa do fazendeiro Viriato, Henrique Schafer), uma menina com rosto angelical capaz de deixar a própria amiga se afogar em lago, sob seus fixos e assustadores olhares. Ficou-nos patente a incompatibilidade de gênios entre as irmãs Chica (Juliana Araripe) e Selma (Camila Raffanti). Quanto à tríade Helena/Laerte/Virgílio, este último defendido por Arthur Aguiar, o comportamento de cada um já por nós pôde ser delineado: Helena ou Leninha é firme, resoluta, convicta de suas decisões; Laerte possui um romantismo doentio, cheio de máculas de ciúme destrutivo e injustificado; e Virgílio nos cativa com sua aparente inocência, pureza, porém dotado de uma resignação e conformismo que não lhes são benéficos. Tanto na primeira quanto na segunda fase, Cyria Coentro (uma das apostas de Luiz Fernando Carvalho em “Renascer”) como Maria brilhou. Tivera marcantes momentos em que evidenciou toda a sua potencialidade dramática. O teledramaturgo parece propositadamente ter reservado grande parcela das ação e tensão para o período da sinopse que antecedeu o atual. Os atores, alguns foram substituídos. Helena é a carismática Bruna Marquezine, atriz que, como sabemos, iniciou sua carreira justo num folhetim de Manoel Carlos, “Mulheres Apaixonadas”. Guilherme Leicam é Laerte, um jovem intérprete que amadureceu a olhos vistos desde “Fina Estampa”, produção cujo elenco integrou na mesma emissora, depois de “Tempos Modernos”, quando fora o filho de Carlos Casagrande e Helena Ranaldi. O novato Nando Rodrigues, natural de Mato Grosso do Sul, como Virgílio, conquistou de pronto a maioria dos telespectadores (especula-se até a sua volta à produção), e não só os femininos, suponho. E Shirley coube a Alice Wegmann, que cumpriu a missão de dar continuidade com desenvoltura ao caráter provocativo, atrevido, cínico e calculista da antagonista de Helena. Guilherme e Nando receberam de presente a oportunidade de participar de uma das melhores cenas já realizadas até o exato instante em “Em Família” (um mérito, claro, outrossim, dos diretores). Usando uma referência cinematográfica, digna de um filme de John Carpenter. O fato ocorreu na despedida de solteiro (na verdade, uma “despedida de horror”) do filho de Itamar (Nelson Baskerville) em uma ampla casa da família, haja vista que no dia seguinte iria se casar com a prima grávida supostamente dele. Junto aos amigos, dentre eles Beto (Pedro Bosnisch) e Fred (Bruno Ahmed), Laerte convidou garotas de programa para o “convescote”. Viu-se uma sequência de “takes”: o começo da festa regada a bastante álcool; a chegada das prostitutas e consequentes tentações; a frágil resistência de Laerte às “investidas” de uma delas; a incitação dos “amigos” e, lógico, a estupefação do vaqueiro diante da iminência de testemunhar a traição da amada. O inevitável decorre: o futuro nubente cede aos encantos da “profissional da noite” e é flagrado por um furioso Virgílio. Há entre eles ríspida discussão, com ofensas seriíssimas e impropérios de todos os tipos. Segue-se uma luta corporal dirigida e ensaiada com perfeição, com a dispensa de dublês. O cume da briga foi o terrível ferimento provocado pelo moço de barba semicerrada e olhos azuis ofuscantes no rosto do seu rival com uma espora. O rapaz cai, bate com a cabeça e desacorda. Laerte julga que esteja morto, e revela seu lado monstruoso ao enterrá-lo (Nando decidiu fazer a tétrica cena). A partir daí, série de episódios se perfaz. O jovem galã é preso no altar pelo delegado (Paulo Vespúcio, um ator com trajetória respeitável no cinema). O pai da noiva Ramiro (Oscar Magrini) não suporta o baque, sofre um ataque cardíaco e falece. Uma tragédia chama outra. Juridicamente, Laerte cometeu as seguintes tipificações penais: tentativa de homicídio (alguns juristas poderiam alegar legítima defesa ou crime passional) e ocultação de cadáver. Como Virgílio sobreviveu graças ao bom pastor alemão General, configura-se lesão corporal de natureza grave. No Brasil a Justiça costuma não ser cega, e Laerte sendo rico e de família influente, é condenado à pena mínima, ou seja, 1 (um) ano de reclusão em regime fechado. A ficção imitou a realidade. Não podemos nos esquecer da referência de Manoel ao famigerado estupro coletivo de uma turista americana numa van no Rio de Janeiro. Entramos afinal na terceira e última fase, e alguns importantes conflitos e abordagens se veem próximos ou vigentes: Helena (Julia Lemmertz honrando o posto) está um pouco mais autocentrada (entretanto não omite sua inquietude ao saber da volta de Laerte, Gabriel Braga Nunes, agora um músico famoso, ao seu país), vive um morno matrimônio com o passivo e estoico Virgílio (Humberto Martins, atuando com precisão); Thiago Mendonça retorna à TV como Felipe, um competente e dedicado médico que infelizmente padece do alcoolismo desde a adolescência (este tema sempre fora tratado com seriedade por Manoel Carlos, nas interpretações de Paulo José e Vera Holtz, por exemplo). A obsessão mórbida de Juliana (Vanessa Gerbelli, que promete ser um dos destaques da novela) em ter um filho, e já que não pode, transfere esta irrefreável vontade para a filha de sua ex-empregada Gorete (Carol Macedo), que está entre a vida e a morte após um atropelamento. A psicopatia de Juliana é tão alarmante que a esposa de Fernando (Leonardo Medeiros em uma performance convincente como de praxe) chega a torcer pelo falecimento da pobre moça, e não se importa em ver o seu enlace desmoronar. O drama da diabetes mal cuidada mereceu atenção na pele de Itamar. Nelson Baskerville deu um tom comovente e com doses de humor ao difícil papel. Seu filho Laerte é casado com a maestrina Verônica (Helena Ranaldi, radiante como de costume), que se habituou à questão do amor mal resolvido do cônjuge com sua prima. Até quando suportará estes “encontros” com o passado? O flautista se apaixona por Luiza (Bruna Marquezine), filha de sua antiga paixão. Um infalível transtorno afetivo/familiar já visto no sucesso “Laços de Família”, do mesmo autor. Marina (Tainá Müller, ótima) é uma fotógrafa especializada em nudez de mulheres com prestígio internacional que não vislumbra problemas na sua homossexualidade. Encanta-se (e abusa do seu poder de sedução irresistível) pela jovial e “solar” Clara (Giovanna Antonelli numa personagem bem diferente da última que fizera na televisão). Clara é casada com Cadu (Reynaldo Gianecchini), um “expert” em Gastronomia, juntos tiveram um filho, e a união é monocórdia. No futuro, Cadu descobrirá que é portador de uma grave enfermidade. Quanto a Clara, entrará em embate consigo mesma diante da possibilidade de vivenciar algo que nunca tivera lugar em sua vida íntima. É muito comum que “heteros” se percebam nesta situação em certa ocasião de sua existência e de modo inescapável têm de enfrentar este novo e perturbador desejo. Chica (Natália do Vale) continua infeliz no aspecto afetivo, com a permanente sensação de “tempo perdido”. Ricardo (Herson Capri), um velho conhecido, poderá mudar os seus rumos. Isso se sua austera ex-mulher Branca (Angela Vieira) anuir. Selma (Ana Beatriz Nogueira) está mais compassiva. Laerte conheceu seu filho com Shirley (que será vivida por Vivianne Pasmanter, uma artista que nunca passa despercebida), Leto (Ronny Kriwat, que após “Avenida Brasil” reaparece mais adulto com o belo sorriso que o caracteriza). Leto admira o pai e se apraz com a música. Bruno Gissoni (André) sente dupla vergonha da mãe: por ela ser negra e por ser adotado. Chegou a dizer no aeroporto quando veio de viagem: – Não precisava ter vindo. Na minha opinião, também não precisava ter dado presentes à mãe Dulce (Lica Oliveira). Aguardemos Paulo José, como Benjamin, que será vítima do Mal de Parkinson, um assunto assaz pertinente a ser debatido, e espero com sinceridade que com o folhetim largo segmento de médicos desqualificados aprendam a diagnosticar corretamente a doença. “Em Família” está no ar. Seus “familiares” também. Somos “visitantes” desta “grande família”. Resta-nos saber quem optará em ser uma fênix e renascer das cinzas ou preferir continuar em estado de pó e ser levado pelo primeiro sopro de vento.

Categorias: TV

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