Foto: Gustavo Paso
A Cia Teatro Epigenia se lança em um projeto ousado calcado na rica dramaturgia de Arthur Miller, a TRILOGIA MILLER, iniciado com a montagem, em março deste ano, de uma de suas mais relevantes peças, “O Preço”
A Cia Teatro Epigenia esteve em cartaz em março deste ano, na Arena do Espaço Sesc Copacabana, no Rio de Janeiro, com um dos maiores clássicos do dramaturgo americano Arthur Miller, “O Preço” (1968), traduzido com virtuosismo por Gustavo Paso e Thiago Russo. O ótimo e inteligente espetáculo , dotado de narrativa estruturada em uma crescente tensão que, alimentada por jogos de diálogos sagazes e surpreendentes, sem dispensar uma ironia calcada na fineza, inicia uma alvissareira revisão das obras de Miller, dentro do projeto TRILOGIA MILLER.
A venda de um mobiliário antigo, após a morte do pai, é a chave para a eclosão de conflitos sequenciais de dois irmãos, que inevitavelmente resultarão em um acerto de contas há muito tempo adiado
O enredo é construído em cima da iniciativa do racional e prático policial, embora sensível, Vitor (Romulo Estrela), casado com a frívola e infeliz Ester (Luciana Fávero), de vender o mobiliário antigo da casa de seus pais outrora ricos já falecidos a um ladino e sarcástico comerciante em apuros financeiros, Salomão (Gláucio Gomes). Tudo transcorreria de modo aceitável se não houvesse a existência de um irmão, o soberbo, frio e egoico médico Valter (Erom Cordeiro), que insurge com propostas e revelações que descortinarão o passado obscurecido do clã.
A evidente sintonia do elenco, encabeçado por Romulo Estrela e Erom Cordeiro, associada a uma direção crítica e humanizada de Gustavo Paso, colabora para que nos entreguemos à alma dramatúrgica de Miller
Romulo Estrela, um cativante intérprete com potencialidades dramáticas enriquecidas por naturalismo desconcertante, compõe um pungente Vitor. Erom Cordeiro, ator de elevados valores, com subtextos na postura e tons de voz, delicia-nos com seu Valter. Gláucio Gomes é um craque, conferindo ao fanfarrão Salomão uma alma sedutora, apesar de sua imoralidade. Luciana Fávero assimila com agudeza as oscilações da esposa frustrada. O diretor Gustavo Paso desenha com visão crítica e olhar humanizado os dramas e conflitos da família em processo de autodestruição permanente, logrando potentes resultados.
Arthur Miller, um autor que obrigatoriamente deve ser montado dentre tantas razões, sendo uma delas o seu profundo conhecimento sobre a essência humana
“O Preço” reafirma a relevância de se encenar Arthur Miller em qualquer lugar do mundo, pois suas universalidade e pesquisa extensa da essência humana se revelam caros para a sociedade contemporânea, sendo melhor com os toques abrasileirados da montagem carioca.