
O especial “Falas Negras”, um misto de linguagem cinematográfica documental com monólogos teatrais, coincide com o espancamento e morte brutais de um homem negro por agentes de segurança brancos de uma rede de supermercados em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, na noite anterior ao Dia Nacional da Consciência Negra
Quinta-feira passada, 19 de novembro de 2020. João Alberto Figueira Freitas, negro, 40 anos, é brutalmente espancado até a morte por dois agentes de segurança brancos de uma rede de supermercados em Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Sexta-feira, 20 de novembro de 2020, Dia Nacional da Consciência Negra, a Rede Globo exibe o especial “Falas Negras”. Obra idealizada e escrita pela talentosa Manuela Dias (“Justiça” e “Amor de Mãe”), com o respaldo da ótima pesquisa de texto de Thaís Fragozo e a sublime direção artística de Lázaro Ramos, que explora com olhar sensível infinitas possibilidades, “Falas Negras”, um impactante misto de linguagem cinematográfica documental com os monólogos teatrais, presta-se oportunamente a dar voz, de 1600 aos dias atuais, a figuras históricas e pessoas comuns negras vitimadas pelo racismo institucionalizado universal e atemporal.
Valorizado por excelentes fotografia, figurinos, trilha sonora e cenário, “Falas Negras” reúne 22 depoimentos reais de grandes figuras históricas e pessoas comuns vítimas do racismo, como Martin Luther King, Nelson Mandela, Marielle Franco e Mirtes Souza, mãe do menino Miguel
Com fotografia deslumbrante de Pablo Baião, figurinos caprichados de Tereza Nabuco, trilha sonora instigante de Wilson Simoninha e lindo cenário (com destaque para o baobá) de Mauro Vicente, o especial enfileira em ordem cronológica 22 depoimentos reais emocionados, intensos e esclarecedores de símbolos negros representativos, como Martin Luther King, Luiz Gama, Malcolm X, Rosa Parks, Angela Davis, Muhammad Ali, Nelson Mandela, Marielle Franco, além de vítimas recentes como Neilton Matos Pinto (pai do adolescente João Pedro, assassinado em sua própria casa por forças policiais) e Mirtes Souza (empregada doméstica mãe de Miguel, menino morto ao cair do prédio após ações e omissões de sua patroa branca).
Com elenco irretocável composto por Taís Araújo, Babu Santana e Fabrício Boliveira, o especial da Rede Globo disponível no Globoplay ocupa legitimamente o seu lugar de fala, fazendo ecoar e incomodando com o seu grito de “Basta!”
O elenco é fabuloso, sendo que todos se esmeraram em suas composições (gestual, prosódia), elevando ao máximo sua carga emotiva. Abrilhantaram o especial Heloisa Jorge (Nzinga Mbandi, Rainha do Reino do Dongo e Matamba), Izak Dahora (Toussaint Louverture, líder da Revolução do Haiti), Olívia Araújo (Harriet Tubman, ex-escrava que se tornou cozinheira e enfermeira na Guerra Civil Americana a fim de obter informações secretas, ajudando na fuga de centenas de escravos do sul do país para o norte), Fabrício Boliveira (Olaudah Equiano, ex-escravo nigeriano que se tornou escritor), Reinaldo Junior (Mahommah G Baquaqua, escravo da África Ocidental que viveu no Brasil e nos Estados Unidos, onde publicou a sua biografia em que relata a terrível experiência brasileira), Aline Deluna (Virgínia Leone Bicudo, socióloga e primeira profissional brasileira não médica a se tornar psicanalista), Flávio Bauraqui (Luiz Gama, líder abolicionista, jornalista e poeta brasileiro), Bárbara Reis (Rosa Parks, ativista americana dos direitos civis), Bukassa Kabengele (Nelson Mandela, advogado, ex-presidente da África do Sul, líder do movimento contra o Apartheid, que segregava os negros no país), Angelo Flavio (James Baldwin, escritor, dramaturgo, poeta e crítico social americano), Samuel Melo (Malcolm X, ativista dos direitos civis americano), Aílton Graça (Milton Santos, geógrafo, jornalista, advogado e professor universitário brasileiro), Guilherme Silva (Martin Luther King, pastor batista e ativista dos direitos civis americano), Ivy Souza (Nina Simone, cantora, compositora e ativista dos direitos civis americana), Mariana Nunes (Lélia Gonzalez, historiadora, antropóloga e professora brasileira), Babu Santana (Muhammad Ali, maior pugilista de todos os tempos), Naruna Costa (Angela Davis, filósofa, ativista e professora americana), Valdinéia Soriano (Luiza Bairros, administradora e cientista social brasileira), Taís Araújo (Marielle Franco, vereadora, socióloga e ativista de direitos humanos brasileira), Tatiana Tibúrcio (Mirtes Souza, mãe do menino Miguel), Silvio Guindane (Neilton Matos Pinto, pai do adolescente João Pedro) e Tulanih Pereira (manifestante que representa os protestos raciais, como o caso de George Floyd nos Estados Unidos). O especial “Falas Negras” ocupa o seu lugar de fala, fazendo o grito “Basta!” ecoar e incomodar. As “Falas Negras” de Manuela e Lázaro importam, tanto quanto as vidas.
Assista à apresentação especial de “Falas Negras”: