Blog do Paulo Ruch

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Foto: Divulgação

Num momento de crise existencial com relação à própria identidade e à significância de seus atos, se de fato eram bons, e se era capaz de praticá-los, Félix (Mateus Solano) ouve de seu “filho” Jonathan (Thalles Cabral), na verdade o meio-irmão, em “Amor à Vida”, novela de Walcyr Carrasco, exibida às 21h pela Rede Globo, uma citação do clássico de Victor Hugo, “Os Miseráveis” (1862), que narra importante passagem no romance do personagem principal, Jean Valjean. E Jonathan lhe conta proximamente o seguinte: “Jean Valjean, após ter sido liberto da prisão onde permanecera por longos anos, sem dinheiro tampouco moradia, recebe o auxílio do Bispo Bienvenu, que lhe oferece comida e casa, um gesto de infinita magnanimidade. Pouco tempo depois, o “miserável” trai o religioso furtando seus talheres de prata. É preso por policiais e conduzido de volta ao lar do religioso. O bispo tem então uma atitude surpreendente: não só negou que Jean havia cometido o crime como ainda disse que se esquecera de levar os candelabros feitos do mesmo rico metal. Pela primeira vez, Valjean se deparou com alguém que o tratara com dignidade, perdoara-o e lhe aconselhara a recomeçar a vida como um homem bom”. Desta forma, o Jonathan do porto-alegrense Thalles Cabral, cujos estudos cênicos se iniciaram na infância e se estenderam em cursos da Cia. do Abração, Academia de Artes Cênicas Cena Hum, Lala Schneider e Escola de Atores Wolf Maya, convenceu o pai de criação de que ele sim poderia estar se tornando uma boa pessoa. Em meio às turbulências da família Khoury, na qual houve inveja, ciúme, desprezo, traição, disputa por poder e vingança, o rapaz que se aprazia em abrir caminhos com skate trajando indefectíveis blusas xadrezes folgadas se evidenciou como um jovem sábio e maduro, a ponto de deste modo ser reconhecido pela “bisa” Bernarda (Nathalia Thimberg), contrariando os demais de sua geração, aplacados por idiotia generalizada, valores tortos, consumismo desenfreado, descendentes de progenitores ausentes e ignorantes na “arte de educar”. Se outrora, tínhamos a “geração Coca-Cola”, a “geração yuppie” e a “geração Y”, atualmente temos a “geração vazia”. O papel de Thalles, um artista que estreara como profissional nos palcos no celebrado Festival de Teatro de Curitiba com a peça de Rafael Cardoso, “Sobre Pais e Filhos”, emendando com a “aula-espetáculo” “História Viva”, de Wladimir Ponchirolli, sofreu no decorrer da trama série de infortúnios: não ganhara a devida atenção de Félix, sendo por este castigado, trancafiado em armário moderno e tendo skate de estimação estraçalhado por pés calçados com sapatos de grife; soubera ser filho de César (Antonio Fagundes), antes avô, fruto de um relacionamento com a legítima mãe Edith (Bárbara Paz) e de que esta no passado fora “garota de programa”, recebendo dinheiro para se casar “por fachada” com o irmão de Paloma (Paolla Oliveira) e dos diversos delitos penais e maldades por ele perpetrados. Mesmo assim, manteve as sapiência, moderação e fleuma que lhe são natas. Em uma das cenas mais bonitas do folhetim que prega “amor à vida”, que serve de exemplo à massa vivente assustadoramente preconceituosa do Brasil, o filho heterossexual Jonathan aceita sem questionamentos o pai homossexual Félix. O neto de Tamara (Rosamaria Murtinho) hoje namora e continua a desfiar seu rosário de frases inteligentes e transformadoras. O intérprete, cantor, compositor (compõe em Inglês; seu pioneiro EP, “That’s What We Were Made For”, com sete faixas, fora lançado no segundo semestre do ano passado), dramaturgo, diretor e estudante de cinema pontuou sua atuação nos olhares fixos, meios e largos sorrisos, fala pausada e pensada (com as alterações cabíveis), sutileza, sensibilidade, fino humor e poder cativante, deixando o público encantado com este novo talento que desponta. Na ribalta, Thalles fez em torno de mais de vinte montagens, em que se destacam “No Natal A Gente Vem Te Buscar”, de Naum Alves de Sousa; “Médico à Força”, de Molière; “O Cavalinho Azul”, de Maria Clara Machado; “A Casa de Consertos (A Bolsa Amarela)”, de Lygia Bojunga; “Amor aos Pedaços” (direção de Elias Andreato); “MPB Revista” (Prêmio Primeiro Passo de Melhor Ator Coadjuvante no Festival de Teatro Laura Schneider); “Maria…Mário…José” (colaborou no texto); “Eu e Elas” (indicação à láurea na mesma categoria supracitada); e “Aqui Jaz a Minha Sogra” e “Aqui Jaz a Minha Sogra – Parte 2” (ambas escritas e dirigidas por ele). “Amor à Vida” se aproxima do epílogo, e Thalles Cabral desde já, como Jonathan, imprimiu marca indelével no imaginário do telespectador como um dos personagens que mais causaram empatia na sinopse de Walcyr Carrasco. Thalles deixou de ser uma promessa para ser um “fato”. Que daqui para a frente viva de seus “desenhos” e criações numa fantástica “arquitetura da Arte”. E que a lição de Jean Valjean sirva para todos nós.

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