Lembro-me que ao analisar alguns personagens de “Fina Estampa” em seu primeiro capítulo, novela das 21h da Rede Globo, de Aguinaldo Silva, lembro-me que me referi ao casal Paulo (Dan Stulbach) e Esther (Julia Lemmertz) como um par bem-sucedido na profissão que parecia feliz, sendo que ele em certa cena mostrou-se completamente fiel à esposa, pois havia resistido ao assédio de uma modelo que participaria de um desfile da Fio Carioca, prestigiada empresa têxtil que ambos possuem. Não foi impressão errada, pois por muitos capítulos davam-se bem. Até que numa viagem dos dois, surge uma médica, Dra. Danielle Fraser (Renata Sorrah), especialista em reprodução artificial. É neste instante que começa o desabamento de um matrimônio até então sólido. Alguns assuntos não resolvidos para eles, e que estavam adormecidos, vêm à tona: a vontade de Esther de ser mãe e a impossibilidade de Paulo de ser pai, devido à sua esterilidade. O caráter estável do casamento fora minando aos poucos à medida que a personagem de Julia Lemmertz manifestou o desejo de se utilizar dos procedimentos médicos alternativos e avançados da Dra. Danielle, o que gerou antipatia imediata de seu cônjuge. De fato, a situação é demasiado complexa. Procuremos não cair de forma fácil em julgamentos morais. Tentemos ver as razões de cada um. Primeiro, Esther. É uma mulher madura, porém jovem, que como várias mulheres quer ter um filho. Só que descarta a adoção. Ela quer sentir as dores e os amores de se gerar alguém no próprio ventre. Já que não pode contar com a contribuição natural do marido, decide por aceitar um embrião fecundado por doadores anônimos. Está certa disso, e tudo leva a crer que não declinará desta ideia, nem que o seu enlace seja comprometido. O sócio e esposo não assentiu. Suas alegações partem do princípio de que terão um “intruso” na convivência. E este problema bastante particular e íntimo deles acaba em ouvidos indesejáveis, como os de Tereza Cristina (Christiane Torloni) e a jornalista Marcela Coutinho (Suzana Pires). As brigas passam a ser contínuas. E Paulo não consegue desvincular trabalho e vida pessoal. Esther continua frequentando a clínica de fertilização de Dra. Danielle, e mostrando-se disposta a levar adiante a decisiva tomada de atitude. E o que antes parecia improvável, decorreu. A traição do irmão de Tereza Cristina. E logo com quem. Com Marcela. Isto gerou desconforto e arrependimento nele. Mas aí já era tarde. Foi uma espécie de vingança e fraqueza, dois elementos que juntos servem para o aproveitamento dos mal-intencionados. Esther descobriu. Mulher sente essas coisas de longe. Agora, uma pergunta que me faço. Não seria o caso da Dra. Danielle esperar um acordo entre o casal, porquanto há uma vontade unilateral de se realizar algo que de brincadeira não tem nada? O que está em jogo é um casamento. Agora, falemos um pouco de Paulo. Convenhamos que não deva ser fácil para um marido acompanhar a gestação de um filho pela sua esposa, sendo que não servira de nenhum modo para isso. A adoção não seria a solução mais pacífica? Já estou num campo de julgamentos. E além de não ter direito a isso, mesmo em se tratando de ficção, sou avesso a qualquer tipo de julgamentos e pré-julgamentos que tangenciem o aspecto moral e, por que não, emocional. A conclusão a que chegamos é que o autor Aguinaldo Silva está abordando um tema dos dias atuais, o qual não podemos ignorar. E este tema carrega em si consequências de inegável magnitude. Haverá discussões, ofensas de lado a lado, crises conjugais e inevitável separação. Contudo, como boa novela, tudo leva a crer que Paulo e Esther terão um final feliz. Digo isto porque em nenhum momento o amor deles pareceu chegar ao fim. Pode estar balançado. Todavia, ao fim não chegou.
Categoria: TV
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O que decorreu com o ator nascido em Juiz de Fora, Minas Gerais, Lucas Malvacini, e que iniciou bem-sucedida carreira como modelo na adolescência, na novela “Amor à Vida”, um grande sucesso de Walcyr Carrasco exibido no horário nobre da Rede Globo, findo há não muito tempo, em que vários intérpretes e respectivos personagens obtiveram destaque, foi algo próximo ao ineditismo. Lucas, que já havia “experimentado” um set de televisão no “remake” de “O Astro”, de Alcides Nogueira e Geraldo Carneiro (basearam-se no clássico de Janete Clair), ao lado de Fernanda Rodrigues, foi escalado para um papel potencialmente árido, que atendia pelo tenro epíteto de “Anjinho”. O personagem se incumbiria de cumprir a tarefa de ocupar posto polêmico desencadeador de miríade de conflitos na história. A Lucas Malvacini, então, que se tornou “a priori” conhecido em todo o país ao disputar e vencer o concorridíssimo concurso “Mister Brasil Mundo 2011” (desta forma o rapaz veio a ser o representante oficial do Brasil nos principais concursos de beleza internacionais) coube o desafiador encargo, imprevisível aos olhos sempre exigentes e implacáveis dos público e imprensa, de personificar com credibilidade o amante/namorado de Félix (Mateus Solano), um dos vilões do folhetim cujas graça e maldades indizíveis se “amalgamavam”. Considerável e avolumada parcela de telespectadores poderia de modo imediato rejeitar Anjinho por razões diversas. É notório e sabido que a sociedade civil (ao menos um segmento dela) “navega na latente turbulência de um mar hipócrita sem fim”. Todos falam em alto e bom som: “Eu não sou preconceituoso!”. Hoje em dia é bonito, conveniente não ter preconceito. Porém, não é o que se testemunha nas ruas, noticiários ou mesmo no discurso de alguém que lhe é próximo. Contraditoriamente ao apelido dado pelo filho de César (Antonio Fagundes), Anjinho poderia ser tachado de “pecador”, ao ser homossexual e “destruidor de lares”. E o mais agravante, um lar heterossexual, ainda que artificial. Antonio Fagundes, que ao meu ver, defendeu com brilho e dignidade o ambivalente, austero e respeitável médico que não respeitava a si mesmo tampouco o semelhante, representou, creio, inestimável percentagem da coletividade social com suas atitudes e opiniões homofóbicas (que numa altiva solução do autor se vira obrigado, pelas contingências, a se redimir). No entanto, o seu olhar sobre Anjinho (para surpresa nossa) se confrontava com o conceito de um outro setor que assistia a “Amor à Vida”. Walcyr Carrasco criou Anjinho com elementos tão sutis e delicados que impossível seria não nos afeiçoarmos a ele. O êxito incontestável do personagem se deve, outrossim, à interpretação meticulosa e disciplinada de Malvacini, que impingiu à personalidade daquele doçura, fragilidade, dependência emocional e imponderável ingenuidade acerca da realidade com riscos que o circundava. Lucas Malvacini, eleito o “Homem Mais Bonito do Brasil” em decorrência da vitória, dentre 40 candidatos, como “Mister Ilha de Búzios”, revelou em cada cena da qual participou nuances eficazes a fim de que não houvesse em nenhum momento rejeição ou não aceitação das pessoas, afora, claro, os empedernidos falsos conservadores. O mais impressionante na passagem de Lucas (que invariavelmente colocou em primeiro plano o objetivo de se estabelecer como intérprete, e para isso sempre se dedicara a estudos por intermédio de leituras apropriadas) pela novela em pauta foi que mesmo após a sua ausência prevista na primeira metade da sinopse e na derradeira despedida na fase final da produção, o nome “Anjinho” não “fugiu” do enredo, sendo mencionado vez por outra, seja de jeito carinhoso, debochado ou com ira, nas oratórias dos demais “characters”. Há que se ressaltar ainda a visível e louvável cumplicidade com Mateus Solano em cena. Mateus que em entrevista afirmara proximamente acreditar que a interpretação alheia ajuda na performance com êxito do parceiro profissional. E Lucas asseverara à mídia sobre a generosidade de seu colega de ofício, o que abriu um caminho para o acerto geral. Outra questão que não deve ser preterida fora a solicitação do público noticiada em veículos de comunicação para que o ator retornasse à trama quando da época de seu afastamento. O pedido, intuo, não se dera somente por sua beleza diferenciada, mas pelos carisma, empatia, competência e sustentação coerente do papel. Como novela é uma obra aberta, o teledramaturgo não se fez de rogado, e a volta de Anjinho reacendeu impasses e contendas entre aqueles direta ou indiretamente envolvidos com ele. Apiedamo-nos duas vezes por Anjinho: quando fora preso acusado por furto de joias (declarado inocente depois de apuração precisa dos fatos) e quando Félix terminara o romance que havia entre ambos em definitivo (Anjinho recebera passagem e dinheiro para viver em Barcelona e retomar a profissão de modelo). Com o desfecho, enganou-se quem pensara que Lucas (que no período em que se dedicara à moda teve gloriosas realizações, como a campanha para a Brookstone; o trabalho fez com que morasse em cidades como Milão, Miami e Santiago do Chile) se acomodaria após o sucesso da novela. O ator desbravador buscou se aperfeiçoar, adquirir novas experiências e evoluir como artista. E não haveria melhor espaço para a concretização desses intentos do que o palco de um teatro. Surgiu-lhe excelente oportunidade de ser um dos protagonistas da ótima comédia romântica de Raul Franco, dirigida por Bia Oliveira, junto com Felipe Roque e Camila Hage no elenco, revezando-se com Luca Pougy, “Crônicas do Amor Mal Amado”. Nós, assim, perguntamo-nos: – Como Lucas se sairá nos palcos? Saberá ele enfrentar a difícil arte da interpretação teatral? E o público? Como reagiria a isto? O espetáculo, com bastante proficiência, abrange a imensidão das possibilidades e probabilidades do amor. Como este é encarado sob distintos prismas. A árdua conciliação entre as discordâncias dos gêneros masculino e feminino. O sexo, seu prazer e frustrações. Os mitos e desmistificações. As cobranças descabidas que acabam por diluir um relacionamento. Lucas deu vida a dois personagens: um psicanalista que interage com a plateia, elucubrando e levantando questões, e Ernesto, que se apresenta com dupla proposta de comportamento. A primeira se o homem mantivesse com a mulher uma relação liberal, aberta, permissiva, e a segunda, um companheiro “comum”, sujeito a ciúme, dúvidas e inseguranças. Ao interpretar o psicanalista, Lucas Malvacini (que além de tudo que já relatei estudara Turismo e participara de um clipe da cantora e atriz Preta Gil, “Sou Como Sou”) demonstrou incrível capacidade de concentração, disciplina e interiorização do papel. O psicanalista é um atento observador das cenas, um segundo olhar, o que poderia facilmente provocar no artista um “escape” do personagem (o que não acontece). A interação com os espectadores exige firmeza, resolução e desenvoltura. A sua voz é clara, límpida e articulada. Não vislumbramos em sua atuação hesitações ou titubeações. Como Ernesto, o intérprete tem a chance de expandir ainda mais o seu talento, com gama sequencial de reações, como destempero, fleuma, impulsividade, indignação, carência, vulnerabilidade, fúria, indignação e uma carga de dramaticidade que atinge a sua posição de equilíbrio pertinente. Todavia, passamos a conhecer um Lucas leve, ágil, circulando com intimidade pela ribalta, engraçado, divertido, irônico e cativante. Não só “Amor à Vida” lhe foi uma vivência rica e marcante em sua trajetória. “Crônicas do Amor Mal Amado” serviu com toda a sacralidade que um tablado pode proporcionar para Lucas Malvacini, o ator desbravador, encontrar algo. Esse “algo” era um outro talento que desconhecíamos, e que, por sorte, encontrara. Esse “algo” estava apenas ali mudo, quieto, parado, silencioso e paciente, esperando que o seu dono o achasse e o levasse para casa. Mas não sem antes visitar o teatro.
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Foto: Barroso Pires Produções ArtísticasQuando vi pela primeira vez quem era o menino escalado para fazer o filho de Luiz Fernando Guimarães e Maria Clara Gueiros, no seriado do próprio Luiz Fernando, Alexandre Machado e Fernanda Young, “Minha Nada Mole Vida”, não tive dúvidas: escolheram o ator certo. Soube que a seleção não fora fácil, afinal o papel seria precípuo na trama. E Hélio, seu personagem, serviria de “ponte” para várias piadas pertinentes envolvendo as peripécias dos intérpretes citados. Inclusive, a escalação de David tivera a aprovação irrestrita de Luiz Fernando. Não poderia ser diferente, pois este possui “tempo de comédia” que já nos é conhecido, e obrigatório seria que David acompanhasse este “tempo”. Aliás, o de Maria Clara, também. Comédia, ou “tempo de comédia”, como pudemos conferir não é problema para David. O seriado foi ótimo, e rendeu divertidos momentos. Agora, a carreira do jovem friburguense começou antes disso. Por influências da mãe e irmã, conheceu o teatro. E ficara cônscio de que estava na profissão que lhe aprazia. Não demorou muito para estrear na televisão, no especial “O Pequeno Alquimista” (2004/2005), baseado em livros de Márcio Trigo. Até que surgiu a oportunidade de fazer uma novela, no caso, o sucesso das 18h da Rede Globo, “Alma Gêmea”, de Walcyr Carrasco. Atuara como Terê. E anterior ao Hélio, ainda contracenara com Reginaldo Faria no especial de Natal, “Papai Noel Existe”. Após “Minha Nada Mole Vida”, vieram os folhetins “Beleza Pura”, e “Caras & Bocas” (reedita a parceria com Walcyr Carrasco, dessa vez, dando vida a Espeto; segundo ele esta obra lhe satisfez bastante). Chegamos ao Lipe de “Ti-ti-ti” (ganhara o Prêmio Arte Qualidade Brasil 2010). Lipe era introspectivo, com discurso afiado sempre pronto para cada instante, além de apreciar música erudita. David Lucas disse já gostar desse gênero musical, porém para melhor compor um dos filhos de Jacques Leclair (Alexandre Borges), passou a escutar mais, inclusive Chopin. E a ler obras clássicas. Quanto ao drama e à comédia, o artista não nega a predileção pelo humor. Terminado o “remake” de Maria Adelaide Amaral, contudo, Lipe, que bom, apenas deu continuidade à bem-vinda trajetória deste rapaz no campo artístico. Tanto é que fora escalado para mais um papel de conotações cômicas, que mostra muito bem a realidade dos jovens diante da avassaladora tecnologia que se apresenta a eles. E um progresso tecnológico que se aproxima dos seus anseios afetivos próprios da idade. Tudo escrito de forma bem-humorada por Aguinaldo Silva, para a produção das 21h da Rede Globo, “Fina Estampa”, na qual David, que faz excelente parceria com Vitor Lucas (Leonardo), interpreta René Junior.
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O maniqueísmo não está presente em todos os personagens de “Fina Estampa”, novela das 21h da Rede Globo, escrita por Aguinaldo Silva. Teodora, o papel defendido por Carolina Dieckmann, é um deles. Muitos adjetivos pejorativos já lhe foram atribuídos, sendo o principal deles “desnaturada”, quando se refere à sua condição de mãe. Realmente é plausível que a chamem desta forma, porquanto por dinheiro, fama e poder abandona o filho bem pequeno Quinzinho (Gabriel Pelícia) sob os cuidados do dedicado pai Quinzé (Malvino Salvador), e o apoio incondicional da avó Griselda (Lilia Cabral). Alguns anos passam. Quinzinho cresce, já está na escola, e possui discernimento de que tem mãe. Uma mãe que estava para ele apenas em porta-retrato na mesinha de cabeceira ao lado da cama na qual dormia com o seu pai. Enquanto isso, nos octógonos da vida, Teodora esbaldava-se em meio a “flûtes” de champagne, dólares e euros decorrentes dos cinturões ganhos por seu marido lutador. Entretanto, para desespero da família da Silva Pereira, a moça que gosta de trajar calças justas, coloridas e metalizadas volta do exterior com o companheiro, pois este tem desafio agendado no Brasil. A situação muda drasticamente para os envolvidos na trama. Griselda fica milionária após ganhar na loteria, e Teodora na iminência de experimentar de novo a modéstia com a impossibilidade do parceiro de continuar a competir. As “flûtes”, os dólares e os euros começam a se distanciar. É neste momento que a mãe de Quinzinho resolve se lembrar de que é mãe de Quinzinho, e procura a ex-sogra fazendo-lhe proposta para lá de indecente. Abriria mão de ver o filho em troca de R$5.000.000,00. Assustador? Põe assustador nisso. A vontade visível da família agora abastada de querer Teodora bem longe do menino é tão grande que aceita o que lhe foi proposto, mesmo que o documento que viria a ser assinado não contivesse valor legal. Todavia, o que todos não esperavam, inclusive Teodora, é que ao se deparar com o infante Quinzinho, fosse nela despertado o que estava adormecido, ou que tivesse nascido o que nunca existiu: o sentimento materno. Teodora espreita o garoto na porta do colégio. Tenta falar com ele. Consegue, e abraça-o. Perde noites de sono. Clandestinamente, leva-o para passear. Quinzinho parece gostar dela. Quer ter uma mãe. Afinal, é uma criança. E esta mãe decide desistir do que antes havia sido acordado. A união com o ex-atleta deixou de ser união, após a descoberta daquele de plano sórdido arquitetado pela pessoa que dividia o mesmo quarto de hotel onde se hospedavam. Cada um foi para um lado. E Teodora foi para o lado de Quinzé. Até com o pai dele, Pereirinha (José Mayer), está morando. Seduções por parte da moça para reconquistar quem deixou têm se repetido. E Quinzé fraquejado. Até beijo involuntário na praia houve. Quanta complexidade se esconde por debaixo dos cabelos de Teodora.
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“Em Família”, a nova novela da Rede Globo que estreou há duas semanas, escrita para o horário das 21h da Rede Globo por Manoel Carlos (e a colaboração de Angela Chaves, Juliana Peres, Maria Carolina, Mariana Torres e Marcelo Saback), com a direção geral de Jayme Monjardim e Leonardo Nogueira (além de Teresa Lampreia, Adriano Melo, Luciano Sabino e João Boltshauser), já teve duas fases, e estamos por ora acompanhando a terceira. Há que se entender que fases são distintas, e que obedecem à função precípua de desenhar um espaço de tempo, acontecimentos determinantes e a evolução da identidade dos personagens de uma trama. Devemos compreender também que cada teledramaturgo carrega a sua marca, o seu estilo, o seu “selo”, o seu tempo. Manoel Carlos já nos é bastante conhecido por sua notória apreciação de passagens nas quais possamos entender com calma, eu disse com calma, a personalidade dos membros de sua história, com a sucessão de diálogos elaborados. A primeira fase serviu de amostra eficiente do perfil dos personagens principais quando mais jovens ou crianças. Maneco, como é chamado pelos que lhe são próximos, quis retratar a vida bucólica e provinciana que aqueles levavam seja em Goiânia seja na fictícia Esperança. Houve a tentativa frutífera de clarificar como nasceu o amor entre os protagonistas Laerte e Helena, Eike Duarte e Julia Dalavia, respectivamente. A “raiz” de seus sentimentos. Como pudemos ser apresentados a Shirley (Giovanna Rispoli), filha de Mafalda (Simone Soares, esposa do fazendeiro Viriato, Henrique Schafer), uma menina com rosto angelical capaz de deixar a própria amiga se afogar em lago, sob seus fixos e assustadores olhares. Ficou-nos patente a incompatibilidade de gênios entre as irmãs Chica (Juliana Araripe) e Selma (Camila Raffanti). Quanto à tríade Helena/Laerte/Virgílio, este último defendido por Arthur Aguiar, o comportamento de cada um já por nós pôde ser delineado: Helena ou Leninha é firme, resoluta, convicta de suas decisões; Laerte possui um romantismo doentio, cheio de máculas de ciúme destrutivo e injustificado; e Virgílio nos cativa com sua aparente inocência, pureza, porém dotado de uma resignação e conformismo que não lhes são benéficos. Tanto na primeira quanto na segunda fase, Cyria Coentro (uma das apostas de Luiz Fernando Carvalho em “Renascer”) como Maria brilhou. Tivera marcantes momentos em que evidenciou toda a sua potencialidade dramática. O teledramaturgo parece propositadamente ter reservado grande parcela das ação e tensão para o período da sinopse que antecedeu o atual. Os atores, alguns foram substituídos. Helena é a carismática Bruna Marquezine, atriz que, como sabemos, iniciou sua carreira justo num folhetim de Manoel Carlos, “Mulheres Apaixonadas”. Guilherme Leicam é Laerte, um jovem intérprete que amadureceu a olhos vistos desde “Fina Estampa”, produção cujo elenco integrou na mesma emissora, depois de “Tempos Modernos”, quando fora o filho de Carlos Casagrande e Helena Ranaldi. O novato Nando Rodrigues, natural de Mato Grosso do Sul, como Virgílio, conquistou de pronto a maioria dos telespectadores (especula-se até a sua volta à produção), e não só os femininos, suponho. E Shirley coube a Alice Wegmann, que cumpriu a missão de dar continuidade com desenvoltura ao caráter provocativo, atrevido, cínico e calculista da antagonista de Helena. Guilherme e Nando receberam de presente a oportunidade de participar de uma das melhores cenas já realizadas até o exato instante em “Em Família” (um mérito, claro, outrossim, dos diretores). Usando uma referência cinematográfica, digna de um filme de John Carpenter. O fato ocorreu na despedida de solteiro (na verdade, uma “despedida de horror”) do filho de Itamar (Nelson Baskerville) em uma ampla casa da família, haja vista que no dia seguinte iria se casar com a prima grávida supostamente dele. Junto aos amigos, dentre eles Beto (Pedro Bosnisch) e Fred (Bruno Ahmed), Laerte convidou garotas de programa para o “convescote”. Viu-se uma sequência de “takes”: o começo da festa regada a bastante álcool; a chegada das prostitutas e consequentes tentações; a frágil resistência de Laerte às “investidas” de uma delas; a incitação dos “amigos” e, lógico, a estupefação do vaqueiro diante da iminência de testemunhar a traição da amada. O inevitável decorre: o futuro nubente cede aos encantos da “profissional da noite” e é flagrado por um furioso Virgílio. Há entre eles ríspida discussão, com ofensas seriíssimas e impropérios de todos os tipos. Segue-se uma luta corporal dirigida e ensaiada com perfeição, com a dispensa de dublês. O cume da briga foi o terrível ferimento provocado pelo moço de barba semicerrada e olhos azuis ofuscantes no rosto do seu rival com uma espora. O rapaz cai, bate com a cabeça e desacorda. Laerte julga que esteja morto, e revela seu lado monstruoso ao enterrá-lo (Nando decidiu fazer a tétrica cena). A partir daí, série de episódios se perfaz. O jovem galã é preso no altar pelo delegado (Paulo Vespúcio, um ator com trajetória respeitável no cinema). O pai da noiva Ramiro (Oscar Magrini) não suporta o baque, sofre um ataque cardíaco e falece. Uma tragédia chama outra. Juridicamente, Laerte cometeu as seguintes tipificações penais: tentativa de homicídio (alguns juristas poderiam alegar legítima defesa ou crime passional) e ocultação de cadáver. Como Virgílio sobreviveu graças ao bom pastor alemão General, configura-se lesão corporal de natureza grave. No Brasil a Justiça costuma não ser cega, e Laerte sendo rico e de família influente, é condenado à pena mínima, ou seja, 1 (um) ano de reclusão em regime fechado. A ficção imitou a realidade. Não podemos nos esquecer da referência de Manoel ao famigerado estupro coletivo de uma turista americana numa van no Rio de Janeiro. Entramos afinal na terceira e última fase, e alguns importantes conflitos e abordagens se veem próximos ou vigentes: Helena (Julia Lemmertz honrando o posto) está um pouco mais autocentrada (entretanto não omite sua inquietude ao saber da volta de Laerte, Gabriel Braga Nunes, agora um músico famoso, ao seu país), vive um morno matrimônio com o passivo e estoico Virgílio (Humberto Martins, atuando com precisão); Thiago Mendonça retorna à TV como Felipe, um competente e dedicado médico que infelizmente padece do alcoolismo desde a adolescência (este tema sempre fora tratado com seriedade por Manoel Carlos, nas interpretações de Paulo José e Vera Holtz, por exemplo). A obsessão mórbida de Juliana (Vanessa Gerbelli, que promete ser um dos destaques da novela) em ter um filho, e já que não pode, transfere esta irrefreável vontade para a filha de sua ex-empregada Gorete (Carol Macedo), que está entre a vida e a morte após um atropelamento. A psicopatia de Juliana é tão alarmante que a esposa de Fernando (Leonardo Medeiros em uma performance convincente como de praxe) chega a torcer pelo falecimento da pobre moça, e não se importa em ver o seu enlace desmoronar. O drama da diabetes mal cuidada mereceu atenção na pele de Itamar. Nelson Baskerville deu um tom comovente e com doses de humor ao difícil papel. Seu filho Laerte é casado com a maestrina Verônica (Helena Ranaldi, radiante como de costume), que se habituou à questão do amor mal resolvido do cônjuge com sua prima. Até quando suportará estes “encontros” com o passado? O flautista se apaixona por Luiza (Bruna Marquezine), filha de sua antiga paixão. Um infalível transtorno afetivo/familiar já visto no sucesso “Laços de Família”, do mesmo autor. Marina (Tainá Müller, ótima) é uma fotógrafa especializada em nudez de mulheres com prestígio internacional que não vislumbra problemas na sua homossexualidade. Encanta-se (e abusa do seu poder de sedução irresistível) pela jovial e “solar” Clara (Giovanna Antonelli numa personagem bem diferente da última que fizera na televisão). Clara é casada com Cadu (Reynaldo Gianecchini), um “expert” em Gastronomia, juntos tiveram um filho, e a união é monocórdia. No futuro, Cadu descobrirá que é portador de uma grave enfermidade. Quanto a Clara, entrará em embate consigo mesma diante da possibilidade de vivenciar algo que nunca tivera lugar em sua vida íntima. É muito comum que “heteros” se percebam nesta situação em certa ocasião de sua existência e de modo inescapável têm de enfrentar este novo e perturbador desejo. Chica (Natália do Vale) continua infeliz no aspecto afetivo, com a permanente sensação de “tempo perdido”. Ricardo (Herson Capri), um velho conhecido, poderá mudar os seus rumos. Isso se sua austera ex-mulher Branca (Angela Vieira) anuir. Selma (Ana Beatriz Nogueira) está mais compassiva. Laerte conheceu seu filho com Shirley (que será vivida por Vivianne Pasmanter, uma artista que nunca passa despercebida), Leto (Ronny Kriwat, que após “Avenida Brasil” reaparece mais adulto com o belo sorriso que o caracteriza). Leto admira o pai e se apraz com a música. Bruno Gissoni (André) sente dupla vergonha da mãe: por ela ser negra e por ser adotado. Chegou a dizer no aeroporto quando veio de viagem: – Não precisava ter vindo. Na minha opinião, também não precisava ter dado presentes à mãe Dulce (Lica Oliveira). Aguardemos Paulo José, como Benjamin, que será vítima do Mal de Parkinson, um assunto assaz pertinente a ser debatido, e espero com sinceridade que com o folhetim largo segmento de médicos desqualificados aprendam a diagnosticar corretamente a doença. “Em Família” está no ar. Seus “familiares” também. Somos “visitantes” desta “grande família”. Resta-nos saber quem optará em ser uma fênix e renascer das cinzas ou preferir continuar em estado de pó e ser levado pelo primeiro sopro de vento.
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Foto: Christian Gaul/Revista TPMO ator português Paulo Rocha, nascido na cidade do Porto, foi pessoalmente convidado pelo autor Aguinaldo Silva da novela das 21h da Rede Globo, “Fina Estampa”, para interpretar Guaracy Martins, lusitano com nome de índio, proprietário de padaria bastante procurada pelos moradores do Jardim Oceânico, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Guaracy é um personagem pitoresco. Torcemos por ele. Transita bem tanto no campo das situações cômicas quanto no das românticas. É um homem que orgulha-se das raízes. Aprecia contar a todos sua história de vida, e o porquê do nome possuir origem indígena. A generosidade, a amizade, a enorme disposição para a labuta sem dispensar rigor por vezes necessário para manter o bom funcionamento do seu negócio são características para nós evidentes. Porém, o que talvez mais chame a atenção no perfil do rapaz de cabelos encaracolados, barba aparada, e olhos azuis seja a intensa vontade de amar uma mulher. Por sinal, desde o início do folhetim, a eleita para as suas fantasias afetivas fora Griselda (Lilia Cabral), ou seja, desde o tempo no qual era o Pereirão, “o marido de aluguel”, a “faz-tudo” sem vaidade ainda assim bonita, que vestia macacão manchado de graxa, e empunhava chave de grifo. Entretanto, após reiteradas investidas que beiraram o fracasso de conquistar a mãe de Quinzé (Malvino Salvador), Guaracy, por conselho da funcionária Dagmar (Cris Vianna), decidiu cuidar melhor do visual. Calças de bainha curta, camisas pouco vistosas e sandálias foram substituídos por roupas sociais. Não adiantou. Griselda não demonstrou entusiasmo. A questão é que ela parecia ter se “fechado” para o amor. O português, meio confuso, em ocasiões diversas, chegou até a gracejar para o lado da moça que lhe prepara as famosas empadas. O ponto máximo da decepção com a agora milionária Griselda deu-se com o anúncio feito por ela mesma de que estava noiva dele. Era apenas um ardil para afugentar Pereirinha (José Mayer). Guaracy passou então a tratá-la com desprezo. E este de alguma forma provocou desconforto na ganhadora da loteria. E de uns capítulos para cá, tem-se notado crescente interesse do comerciante por Esther (Julia Lemmertz), em crise no casamento, e que viciou-se nas suas empadas. O carinho mútuo é notório, e o ciúme de Paulo (Dan Stulbach) e Griselda, também. Tudo leva a crer que haverá romance ou algo próximo. Já quanto ao intérprete Paulo Rocha, estudou na Escola Profissional de Teatro de Cascais. Integrou o Teatro Experimental de Cascais, tendo encenado Alexandre Dumas e Tennessee Williams, por exemplo. No currículo, há inúmeras participações na televisão, e incursões no cinema. Paulo Rocha merece respeito. Ou como Guaracy diz: “Respeitinho.”
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A nova série da Rede Globo, que estreou na última terça-feira, “A Teia”, de Bráulio Mantovani e Carolina Kotscho, com a colaboração de Lucas Paraízo, André Sirangelo, Stephanie Degreas e Fernando Garrido, tendo como diretores gerais Rogério Gomes e Pedro Vasconcelos (a direção de núcleo é de Rogério Gomes), mostrou logo em seu primeiro episódio todos os elementos típicos de uma narrativa que se enquadra nos gêneros ação/policial, não deixando nada a dever aos similares americanos que “monopolizam” este segmento que atrai tantos espectadores. Em terras ianques, o que não faltam são bons exemplos deste modelo de filme. Na passagem dos anos 60 para os 70, tivemos grandes êxitos comerciais, como “Bullit” (1968), com Steve McQueen e “Dirty Harry” (1971), com Clint Eastwood (que prosseguiu com uma bem-sucedida franquia). No tocante especificamente ao roubo de cargas, dois ótimos longas-metragens merecem menção: “O Primeiro Assalto de Trem”, dirigido por Michael Crichton em 1979, em cujo elenco estão Sean Connery e Donald Sutherland e um dos maiores clássicos nacionais “Assalto ao Trem Pagador” (1962), inspirado em fatos reais, com a direção de Roberto Farias. No “cast”, Reginaldo Faria, Grande Otelo, Eliezer Gomes, Jorge Dória e Ruth de Souza. Ao sintonizarmos nossas TVs em “A Teia”, fomos “de uma levada só” a testemunhar ferozes e alucinadas perseguições de veículos, desvairados tiroteios, romance em meio a bandidagem, confrontos psicológicos e os bastidores de uma investigação de um crime de porte elevado. A história de Bráulio Mantovani e Carolina Kotscho (inspirada em acontecimentos verídicos) começa com uma caçada implacável por policiais à caminhonete na qual se encontram o casal protagonista Baroni (Paulo Vilhena, que dispensou muitas cenas de dublê em que a presença deste era necessária), Celeste (Andreia Horta), sua amante e ex-prostituta, e a filha desta, Tereza (Nathalia Costa), fruto de uma relação com um detento, Ney (Gustavo Machado), que Baroni conhecera na prisão, e dele se tornara inimigo. No decorrer do cerco inescapável, Baroni perde o controle do carro, e uma profunda e assustadora ribanceira o aguarda. O rapaz e a menina, com seu ursinho Bola, sobrevivem. Paira uma dúvida se o mesmo ocorreu com Celeste. Há um “flashback” de três meses, com a apresentação da execução de um audacioso, elaborado, complexo e arriscado roubo de uma carga de 60kg de ouro que seriam transportados por um avião no Aeroporto de Brasília. A quadrilha possui, em média, de 8 a 9 membros, e estavam fortemente armados. O delito penal, comandado por Baroni, obtém sucesso, o que causa incômodo e enorme rebuliço nos corredores e salas da Polícia Federal. O Superintendente Regional da Polícia Federal de Brasília Eudes Andrade (Luciano Chirolli) designa o delegado Jorge Macedo (João Miguel) para ser o responsável pelas investigações do roubo que estremeceu os alicerces e o brio da respeitada instituição policial. A princípio, Macedo recusa a missão. Decide, então, aceitá-la, sob a seguinte condição: que seja reconduzido ao posto que ocupara em Fortaleza, de onde fora, a pedido dos próprios companheiros de trabalho, transferido para a Capital Federal. Há um mistério que envolve a sua forçosa transferência. Na verdade, a razão pela qual o personagem de João Miguel pretende retornar à cidade nordestina é o fato de ficar mais próximo de sua família, a esposa Isabel (Ana Cecilia) e a filha Paula (Aline Peixoto). Macedo contará, para desbaratar a quadrilha de delinquentes, com a colaboração dos agentes Libânio (Fernando Alves Pinto) e Taborda (Michel Melamed). No entanto, o pujante esquema policial se deparará com o inesperado. O grupo criminoso não se resume a alguns poucos ladrões que não chegam a uma dezena. Políticos influentes e poderosos, mafiosos de diferentes países, policiais ligados à corrupção e prisioneiros de alta periculosidade estão envolvidos neste amplo “emaranhado”, nesta “teia” que deverá ser desmanchada. Uma situação pontual nos despertou curiosidade. A mãe de Jorge, Áurea (Denise Weinberg) inicia um romance com um ex-senador, Gama (Miele), antigo desafeto do filho que tentou denunciá-lo e prendê-lo por atos incompatíveis com o seu mandato. Mas a época política se caracterizava mais pela impunidade. Jorge deixa bem claro que quer o ex-senador longe de sua mãe. Mesmo com tantas cenas de se tirar o fôlego e que prenderam a nossa atenção, houve um momento de contemplação, com as belas paisagens dos desfiladeiros da Chapada dos Guimarães, no Mato Grosso. O elenco, sem exceções, está em harmoniosa cumplicidade com a intenção do projeto da série. É quase inevitável não nos lembrarmos de Faye Dunaway e Warren Beatty, como Bonnie e Clyde, no memorável longa-metragem de Arthur Penn, “Bonnie e Clyde – Uma Rajada de Balas” (1967) ao vermos a dupla formada por Andreia Horta e Paulo Vilhena. A trilha sonora é eclética, “atravessando” estilos como o rock, o folk e o blues. A montagem é esperta, acelerada, dinâmica, trepidante, nervosa, quase não nos dando tempo para pensar, enfim, um acerto sem contestações. Rogério Gomes e Pedro Vasconcelos merecem loas por aceitarem sem receios “embarcar” nesta aventura, na acepção literal do vocábulo, e realizarem com capricho, dedicação e “know-how” um episódio que nos dá abrangente visão do que teremos a seguir. Convém ressaltar que a quase totalidade das cenas fora gravada em externas, e que os diretores foram obrigados a lidar com um aparato tecnológico que exige experiência e noção precisa de seu manuseio. “Takes” com helicóptero, avião, veículos, armas e consequentes tiros não são nada fáceis de dirigir, é razoável que se ressalte. Bráulio Mantovani e Carolina Kotscho, incensados roteiristas de cinema, em sua estreia como parceiros profissionais, exibiram notória conjugação de ideias e objetivos dramatúrgicos, o que resultou em produto coeso, envolvente e instigante, sem, em nenhuma ocasião, terem se deixado levar pelos sorrateiros clichês. “A Teia”, com seus ótimos texto, elenco e direção nos “prendeu”. Difícil será nos desgarrarmos dela.
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Se para os atores em idade adulta dificultoso é se manter na profissão escolhida, numa ferrenha busca por papéis que a justifiquem, mais árduo ainda é para os intérpretes que brilharam na infância, estiveram em privilegiada berlinda, e foram obrigatoriamente impulsionados a ultrapassar a dolorosa fronteira que os separa da adolescência, fase esta na qual temos que nos esquecer, de modo imperante, das fantasia, ingenuidade, pureza, quase ausência de preocupações e problemas e salutar “alienação do mundo”. Esta etapa da vivência do homem, inevitável em si mesma na sua pouco ou nenhuma condescendência, dá-nos de “um dia para o outro” transformações no corpo e inescapável enfrentamento de questões atinentes à condição humana até então não debatidas. Digo isso a fim de corroborar que as vicissitudes por que passam as pessoas “comuns” passam os artistas do segmento cênico. Este peculiar fenômeno não é uma prerrogativa nossa, evidenciando-se em demais nações, inclusive na “Meca do Cinema”, os Estados Unidos. Se na terra ao norte do continente americano, deslumbramo-nos com as atuações de Jackie Coogan (“O Garoto”), Shirley Temple (“O Pássaro Azul”), Carl Switzer, como Espeto, e George “Spank” McFarland, como Batatinha (“Os Batutinhas”), Macaulay Culkin (“Esqueceram de Mim”) e Haley Joey Osment (“O Sexto Sentido”), tempos adiante não mais foram vistos com o realce que obtiveram. Há aqueles que pugnam para continuarem com mínima projeção, como Anna Paquin (“O Piano”), Heather Matarazzo (“Bem-vindo à Casa de Bonecas”) e Christina Ricci (“Família Addams”). No entanto, existem os que perpetuaram a glória, como Natalie Portman (“O Profissional”) e Christian Bale (“O Império do Sol”). No Brasil, bons exemplos são Gloria Pires, Isabela Garcia, os irmãos Selton e Danton Mello e… Klara Castanho. A atriz paulista de Santo André, que deu os seus primeiros e promissores passos na TV no seriado “Mothern”, no canal GNT, como Isabel, e na novela do SBT “Revelação”, como Daniela Mourão, logrou reconhecimento no país ao ser convidada pela Rede Globo para integrar o elenco da produção de Manoel Carlos, “Viver a Vida”, em que formou dupla irresistível com Giovanna Antonelli como mãe e filha, Dora e Rafaela (ganhara a láurea “Melhores do Ano” na categoria “Melhor Ator ou Atriz Mirim”, concedida pela TV Globo, e o “Prêmio Contigo! de TV de Melhor Atriz Infantil”), respectivamente. No momento, Klara se destaca como Paulinha na segunda trama de Walcyr Carrasco da qual participa, “Amor à Vida” (a primeira fora “Morde & Assopra”, levada ao ar às 19h na mesma emissora; nesta sinopse a atriz teve que mostrar a sua versatilidade ao defender Tonica, pois se tratava de uma personagem rural ou “caipira”, com direito a sotaque e gestual característicos). Paulinha é, sem resquícios de especulação, um dos membros precípuos do enredo criado por Walcyr, desencadeador de toda a dinâmica central da história, gerando densos conflitos, culpas, intrigas, armações, mentiras, fingimentos, ardis, dores e consequentes dissabores. A Paula de Klara Castanho, que antes se familiarizara com o universo espírita de Elizabeth Jhin na faixa das 18h em “Amor Eterno Amor”, como Clara, e gravara a décima primeira edição do DVD “Xuxa Só Para Baixinhos”, é um “character” espinhoso para qualquer ator, seja ele experiente ou não, cobrando-lhe alta carga dramática, sem cair no “overacting”, um dosado estoicismo perante as adversidades que lhe foram impostas, e acima de tudo, um sentimento visível de amor, afeto, emoção e sensibilidade, imiscuídos em radiante doçura. A dona do cãozinho Aladim se sobressai por sua integridade, caráter ilibado e uma inocência não perdida. Já nos primeiros capítulos, ficamos todos terrificados com o gesto sórdido de seu tio Félix (Mateus Solano), em processo de redenção, ao jogá-la em estado de recém-nascida em caçamba de lixo envelhecida, após ter sido arrebatada dos braços desfalecidos da mãe Paloma (Paolla Oliveira), deitada em “berço” nada “esplêndido” de local imundo ao qual não se pode tampouco nomear de banheiro, sito em bar cujo odor que reina é o “perfume” do álcool sorvido pelos desiludidos da selva urbana. Misturada aos detritos, com seus estridentes vagidos, despertam os aflitos ouvidos do “órfão” de esposa e filho Bruno (Malvino Salvador). A menina por ele fora criada ilegalmente, com o auxílio de cúmplices, sem a vigília indispensável dos olhos maternos. A dona desses olhos, Paloma, viveu longos anos “mergulhada na profundidade de um mar escuro” sem o fruto que gerara. O “Sr. Destino”, sempre misterioso em suas veleidades, encarregou-se, todavia, de que a bela doutora do Hospital San Magno, já afeiçoada a Paulinha desde quando era bebê, motivada por forte apego materno “inexplicável”, e companheira do pai de criação irmão de Gina (Carolina Kasting), diante de uma enfermidade que acometera a jovem de bonito e honesto sorriso, decide ser voluntária de um transplante urgente. Os exames de compatibilidade sanguínea não só atestaram que Paloma era a sua legítima mãe como negaram a paternidade do corretor de imóveis, forçado então a contar toda a verdade. O “posto” paterno é ocupado por Ninho (Juliano Cazarré), o “hippie chic” sombrio, que se outrora prometia à amada o mundo e as estrelas, no exato instante é aliado de Aline (Vanessa Giácomo), “expert” em “cupcakes” envenenados, num plano repugnante de destruir e depenar o patrimônio do preconceituoso César (Antonio Fagundes). Ninho, exímio patinador “indoor” de gelo, é autor de infinda galeria de tipos penais, que vão do sequestro e cárcere privado e terminam na formação de quadrilha e tortura. Os outros não convém comentar. Contudo, mesmo depois de ter sido sequestrada pelo pai, e sofrer o que os especialistas chamam de “Síndrome de Estocolmo” (quando a vítima constrói uma relação afetuosa com o algoz), fica dividida entre os dois “pais”. Vê-se num período de rebeldia compreensível, muito em decorrência das influências negativas do rapaz que se refere aos seus pares como “véio”. Defronta-se com Bruno e Paloma (o casal se reuniu ao término de disputas judiciais, subsequentes acordos e descoberta de ignóbil armadilha urdida pela “confeiteira malévola”). Em meio a isso, um tablet, que proporcionara encontros às escondidas de filha e pai. O que se percebe nesta reta final de “Amor à Vida” é que Paulinha começa a inquirir os que a cercam sobre o porquê da frieza de tratamento do tio Félix. “Por quê?”, ela diz. Ninguém lhe responde. Acredito que o autor não desperdiçará a rica oportunidade de pôr “tête-à-tête” dois ótimos atores, Mateus Solano e Klara Castanho, num aguardado e tenso acerto de contas. Se bem conhecemos Paulinha, com sua elevada alma e precoce sabedoria, a reação será surpreendente, ou seja, será capaz de perdoar o tio que ela considera elegante e charmoso. Concluímos que Klara Castanho “escreveu sua história” no enredo vigente do horário nobre. Aplausos para ela. E que todos sejam “bem-vindos à próxima ‘casa’ da ‘boneca’ Klara Castanho”.
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Foto: Roberto Filho/Philippe Lima/AgNewsUma cena marcante que já decorrera há algum tempo em “Fina Estampa”, de Aguinaldo Silva, novela das 21h da Rede Globo, fora justamente a de Quinzé (Malvino Salvador) buscando o seu filho Quinzinho (Gabriel Pelícia) na escola, e ao levá-lo para casa, colocou-o sobre os ombros, como é de costume, e saiu a caminhar pela calçada. Em determinado momento, Malvino dirige o próprio olhar para cima, sorrindo, buscando uma cumplicidade daquele que com tanto zelo e carinho cuida. A cena nos foi mostrada em “slow motion”, o que só aumentou a preciosidade de cada gesto, de cada movimentação, de cada expressão no rosto. Tudo o que aqui narrei foi testemunhado pela personagem de Carolina Dieckmann, Teodora, que ao que parece, a partir dali, passou a se dar conta de que ainda poderia existir um sentimento de ternura não somente com relação a Quinzé, mas também ao filho que abandonou. O rapaz destaca-se na trama por sua incondicional dedicação a um menino fruto de um relacionamento no qual acreditava. E que, de forma abrupta, interrompeu-se pela decisão intempestiva de Teodora de preteri-los em prol de uma vida mais confortável. O ex-ajudante de bar, que hoje é gerente do negócio da mãe Griselda (Lilia Cabral), devotou-se de modo abnegado ao filho e ao trabalho. Abriu mão por razoável lapso dos compromissos amorosos. Chegou a se interessar por Dagmar (Cris Vianna), porém o romance não foi para a frente. Da parte dele o que havia era afeto associado a uma atração física, pois na verdade nunca deixou de gostar da mãe de seu rebento. Por mais conselhos que ouvisse, fossem de Griselda, fossem de Dagmar, o que sente por Teodora, a despeito de ter dito que se trata de “sua maior inimiga”, e dela ter feito tudo o que fez, é inabalável. Com a aproximação da moça com o intento de lutar pela guarda do garoto, tendo o apoio involuntário de Pereirinha (José Mayer), vítima de chantagem, as dúvidas e conflitos de Quinzé só tendem a aumentar. Agora, falemos um pouco sobre a carreira deste amazonense, nascido em Manaus, que partiu para São Paulo, capital, em busca de oportunidades profissionais a princípio como modelo. Em 2004, estreia na televisão (Rede Globo), já como ator, sendo Tobias, no “remake” de “Cabocla”, de Edmara e Edilene Barbosa, adaptado da obra de Benedito Ruy Barbosa. Em seguida, a primeira parceria com Walcyr Carrasco, em “Alma Gêmea”, folhetim no qual como o cozinheiro Vitório pôde provar que sabe fazer comédia. Surge a chance de interpretar um vilão, Camilo, dessa vez em texto de Ivani Ribeiro, “O Profeta”, cuja adaptação coube a Duca Rachid e Thelma Guedes. Atuou como boxeador, no papel de Régis, em “Sete Pecados”, de Walcyr Carrasco. Ganhou notoriedade em “A Favorita”, o grande sucesso de João Emanuel Carneiro como Damião, um trabalhador simples que se envolve com a primeira-dama da cidade (Helena Ranaldi), cujo marido é o seu melhor amigo (Leonardo Medeiros). Ganha o posto de protagonista em “Caras & Bocas”, de Walcyr Carrasco, como Gabriel. No cinema, deixou seu talento em filmes como “Qualquer Gato Vira-Lata”, baseado em texto de Juca de Oliveira, e dirigido por Tomás Portella, e “O Signo da Cidade”, de Carlos Alberto Riccelli. No teatro não fez por menos ao encenar espetáculos importantes como a “Paixão de Cristo” e “Mente Mentira”, de Sam Shepard. Quanto a Quinzé, independente do fato de como será o seu final com Teodora, torçamos para que os lindos e líricos instantes em que caminha nas calçadas com o filho sobre os ombros se repitam.
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Na verdade, não fora somente a jornalista e apresentadora Fátima Bernardes quem sempre acreditou no seu projeto de fazer um programa próprio. Ficou-nos provado há onze dias que a direção da Rede Globo também depositou confiança na decisão surpreendente de Fátima. Numa edição do Jornal Nacional de uma sexta-feira, o jornalista, apresentador e editor-chefe do jornalístico mais assistido do país, William Bonner, anunciou a saída de Fátima Bernardes da tão famosa e almejada bancada, por resolução dela mesma. E que quem a iria substituir seria a jornalista e apresentadora do dominical Fantástico, Patrícia Poeta. E em seu lugar ficaria Renata Ceribelli, já substituta de Patrícia nas suas ausências. Uma justa escolha. Já quanto a Patrícia, fomos informados de que fora unânime tanto por parte de William Bonner quanto por parte dos principais responsáveis pelo Jornalismo da emissora de que o nome natural para ocupar o posto de Fátima seria o dela. Sem dúvida, o nome certo, a despeito de haver outras excelentes profissionais no campo da notícia capazes de apresentar o JN, e que já o fazem em determinadas situações, como Renata Vasconcellos e Ana Paula Araújo. O que contou a favor de Patrícia provavelmente fora o fato de possuir, além de indiscutível credibilidade, uma inegável popularidade junto ao público. O que dita de forma precípua o que se define como bom jornalista é a credibilidade. É acreditarmos naquilo que fala, independente do assunto que esteja abordando. Na segunda-feira seguinte, os minutos finais do Jornal Nacional foram dedicados à despedida de Fátima Bernardes, que pareceu-me feliz e confiante por enfim ter um projeto seu maturado por quatro anos aprovado. Houve uma homenagem, uma espécie de retrospectiva das carreiras tanto de Fátima quanto de Patrícia Poeta, que estava presente. Patrícia, como era de se esperar, na terça-feira estreou bem, com segurança, firmeza, e apropriada simpatia nos momentos que assim permitiram. Só teve que cortar um pouco os cabelos, e passar a usar roupas compatíveis com a proposta do JN. Nenhum problema. Continua bela e elegante. Quanto à trajetória de Fátima, que permaneceu à frente do telejornal em questão por quase quatorze anos, estudou na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), após experiência como bailarina. Tinha como intento ser crítica de balé. Seu primeiro emprego fora no jornal O GLOBO. Decorrido algum tempo, foi contratada pela Rede Globo, e logo estava no comando do extinto RJTV 3ª Edição. Rumara para o Jornal da Globo para dividir a apresentação com Eliakim Araújo. William Bonner, depois, substituíra Eliakim. Com Celso Freitas e Sandra Annemberg apresentou o Fantástico, ao qual voltaria ao lado de Pedro Bial. Houve ainda temporada no Jornal Hoje, em que exercia as funções de apresentadora e editora. Em 1998, inicia a longa permanência no Jornal Nacional, acompanhada de William Bonner. Destacou-se em muitas reportagens. As coberturas jornalísticas esportivas internacionais chamaram a atenção, como as Copas do Mundo e as Olimpíadas, tendo como curiosidade o fato de ter sido eleita pelos jogadores a “Musa da Seleção”, pentacampeã de futebol em 2002. Levantou a taça e tudo. Agora é esperar pelo novo programa de Fátima Bernardes, que é mantido sob sigilo absoluto. O que se sabe apenas é que haverá jornalismo. Pelo que conheço da história desta exímia profissional é que poderá haver entrevistas em estúdio, matérias em campo (local da notícia), e até variedades. E o horário da atração? Seja qual for, acho que os telespectadores irão reprogramar suas agendas para prestigiar Fátima.






